quarta-feira, 27 de outubro de 2010
Primeira incursão na ficção, peço a quem ler que, se achar uma bosta, ser indulgente com um iniciante. Esse conto é baseado livremente numa lenda urbana que circula desde sempre nos hospitais do Rio de Janeiro, não tenho como saber se realmente aconteceu...
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    "Fazia mais de uma hora que ele estava sentado no chão daquela despensa, imóvel, as mãos na cabeça, balançando pra trás e pra frente, numa espécie de catarse induzida pelo choque e pelo ódio. Já tinha gritado, esmurrado a porta, se machucado até, e nada. Ninguém acudia. Do outro lado da porta, já não se ouviam mais os gritos e súplicas de sua mulher e sua filha de 8 anos, nem as palavras pejorativas dos dois assaltantes. Mortas. 'Pelo menos não estavam sofrendo mais...'.
    A causa mortis de ambas foi dada como asfixia mecânica, e um sem contar de lesões perfuro cortantes, canivete provavelmente, além de sinais de estupro no laudo do IML. Latrocínio. Nada daquilo fazia sentido pra ele, ele só queria uma única vez mais abraçar suas duas razões de viver, arrancadas de sua vida daquela maneira estúpida, e dizer o quanto elas tinham sido importantes. Não tinha forças mais pra nada.O pouco de sua  fé que tinha sobrado estava nas urnas mortuárias, junto com as cinzas.
    Nem o apoio dos amigos, nem o trabalho, nem o tratamento psicológico. Ora, onde já se viu preferir colocar a culpa de sua miséria na coitada da sua mãe, ao invés daqueles dois demônios que tinham, num único dia, destruído o que levou anos para ser construído, deixando-o naquele estado, mortificado? 'Vou embora dessa cidade maldita', era o que ele conseguia repetir nas sessões, falando daquela que tinha se tornado uam espécie de Sodoma ou Gomorra pra ele : Rio de Janeiro. Não, não podia continuar morando ou trabalhando naquele inferno, iria procurar uma oportunidade de ir embora, vaga para anestesista era o que não faltava em outras cidades,  capitais ou interior do Brasil. Enfim, nada conseguia dirimir  seu sofrimento e teve que voltar ao trabalho até achar um lugar pra ir.
    Tinha se tornado uma espécie de zumbi, de boneco sem vida cuja única força motriz era o ódio e desejo de vingança . Ia para o hospital, fazia seu trabalho sem uma palavra a mais que o estritamente necessário e voltava no fim de tarde , não antes de ter se aplicado uma generosa dose de fentanil(1), que ia se completar com o uísque e os tranquilizantes, em mais uma noite que passaria fora da realidade, entregue.
    Suas feições se contraíram num esgar de raiva quando ele viu aquele paciente entrando em uma maca na sala de cirurgia, fácies de dor, as mãos segurando o abdome como se suas vísceras fossem sair por ali, para realizar uma laparotmia após lesão por PAF(2). Reconheceu nele o ser abominável que o havia mandado para aquele inferno em vida. Sem falar nada, passou o garrote em seu braço, pegou uma veia. Virou-se,pegou as drogas para indução e conectou a primeira( e que seria a única...) no equipo, abaixou perto dos ouvidos do paciente, tirou sua máscara e disse: 'Tá lembrado de mim, filha da puta, de um assalto naquela casa no Alto da Boa Vista, uma mulher e uma menina na casa...lembra?' A cara do outro se encheu de horror ao reconhecê-lo, mas não houve tempo, o anestesista rapidamente injetou o relaxante muscular(3), causando paralisia imediata. Não iria administrar as drogas restantes, aquelas que tirariam sua dor e sua consciência durante a cirurgia.O demônio parecia cochichar em seu ouvido, rindo de tanto prazer...
    Entubou-o, colocou-o em ventilação mecânica e virou-se casualmente para o cirurgião com um sorriso no canto dos lábios:'Pode começar...' A incisão veio acompanhada do disparo de alarmes nos monitores, em sua cabeça uma canção maldita que parecia estar sendo orquestrada pelo próprio diabo. Arritmias, taquicardia intensa, pressão arterial nas alturas, o anestesista desabilitou todos os alarmes e respondeu casulamente a pergunta do cirurgião se estava tudo bem 'Tudo ótimo, pode seguir...'
    A morte veio provavelmente como um bálsamo para aquele miserável, pouco tempo depois, retirando-o da cruz onde havia sido pregado. O anestesista, durante o procedimento, por algumas vezes ainda chegou perto de seus ouvidos e sussurrou as palavras que tinha ouvido de sua nulher e sua filha naquele dia fatídico.
    Tempos depois, decidiu estar entre os vivos não fazia mais sentido. Preparou seu quarto e o soro contendo 1 g de tiopental sódico, o relaxante muscular e o cloreto de potássio(4), conectando então à sua própria veia. Ultimamente, não conseguia nem mais chorar, como se houvesse secado, mas como que adivinhando que aquele momento tinha chegado, seus olhos expeliram a derradeira lágrima de sua vida. A última cena que viu por entre os olhos embaçados foi do garrote em seu braço ser solto, iniciando a infusão..."



Notas do autor:

1) Morfínico potente usado em anestesia, tem como efeitos que podem levar ao vício a euforia, sensação de bem estar, sono.
2) Laparotomia é a abertura da cavidade abdominal, no caso por PAF, projetil de arma de fogo.
3) Droga usada como paralisante, causando relaxamento de toda musculatura, inclusive a responsável pela respiração, o que facilita a cirurgia.
4) Drogas usadas na pena de morte por injeção letal, a primeira causa perda da consciência, a segunda paralisia muscular e a terceira, parada cardíaca.
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
  Última parte sobre as aventuras etílico-amorosas de nobres colegas de profissão, começo pela situação sem sombra de dúvida em que eu mais ri em minha vida. Hoje prestarei homenagem também aos pudicos Imperadores Romanos mais famosos da História.
Vale do Alcantilado, em Mauá
  Ano corrente de 1995, bucólica e aconchegante cidade de Visconde de Mauá, no Rio de Janeiro. Pra quem não conhece, Mauá é um lugarejo fundado por hippies, com grande preseça dos mesmos até hoje, visual belíssimo. Num camping qualquer, em duas barracas, muita cerveja Sol e Jose Cuervo, encontravam-se amontoados eu, Einstein(lembram dele?), Nero e Calígula em outra. Lá pelas tantas, Nero consegue arrastar para sua barraca a muito custo uma recatada integrante de uma Igreja Evangélica da região. Após argumentação acalorada, ele consegue iniciar com a mesma o desejado intercurso sexual, quando Calígula, totalmente ébrio, abre o zíper da barraca para dormir. A religiosa então começa uma ladainha de "aimeudeus, aimeudeus..." e Nero consegue convencê-la a ficar, pois o outro já estava praticamente em coma e não iria atrapalhar, e esse foi seu erro... A mesma se deixa convencer e continua com os choques pélvicos e gemidos em sucessão, quando de repente Calígula desperta, pula pra cima do casal dizendo "eutambémquero, eutambémquero...". Ato contínuo, a pobre começa a gritar "Ai Jesus, porque me abandonaste?", põe a roupa de qualquer jeito, consegue se desvencilhar da situação e sair da barraca.
Nero em desespero...
   Nesse momento, eu e Einstein saímos de nossa barraca e vemos a seguinte situação: Uma menina seminua, aos berros de aijesus, correndo pelo camping, sendo PERSEGUIDA por Calígula, que tentava inutilmente passar uma banda pra coitada cair. Como Calígula tinha asma de esforço e estava chapado, ela consegue fugir, e este volta em plena crise asmática, procurando sua bombinha salvadora. Eu e Einstein deitados no chão de tanto rir, e Nero puto da vida dizendo: "Porra, esse filha da puta podia pelo menos esperar eu gozar!!!". Cai o pano

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Ahhh Porto Seguro...
  Após um bem sucedido Carnaval em Guriri, partimos eu, Einstein(sempre ele...), Tibério e Marco Antônio para Porto Seguro, farrear mais uns dias e tentar mais alguns pontos no nosso escore de machos-chauvinistas-sem coração (Andréa, se você ler isso, saiba que eu te amo e não sinto a menor falta desta época, você é minha vida agora... ;)). Tibério gostava muito, nos últimos dias de Carnaval, de aproveitar o máximo possível, ficar virado direto sem parar de beber.
  Cumprindo esta rotina, quando saímos pra Porto, Tibério desmaiou no banco de trás e permaneceu na mesma posição até o destino. Estávamos sem pousada reservada, então paramos e fomos procurar, só que quem disse que conseguíamos acordar Tibério? Gritamos, sacudimos, jogamos água, cheguei a dar uns tapas bem fortes em sua cara, arrancando gargalhadas dos outros, numa brincadeira maldosa que tínhamos na época reservados para os amigos nessa situação...(rio só de lembrar das porradas, sou imaturo?). Segue-se o diálogo:
  Eu: Fecha o carro, larga esse porra aí e vamos procurar, a gente volta rápido.
  Einstein: O cara vai morrer sufocado aí...
  Eu: Sufocado porra nenhuma, o carro não é completamente vedado, sua besta. Se quiser, deixa uma frestinha aí pro cara respirar então.
  Einstein: No cu, não vou facilitar pra bandido roubar.
  Eu: faz o que tu quiser então mas vamos então se não a gente vai dormir no carro com esse cretino aí.
Neste carro embaçado dorme uma pessoa feliz...
Partimos, achamos a pousada e resolvemos beber uma cervejinha, afinal era só uma e Tibério ficaria bem, o máximo que ia acontecer era ele acordar e não saber onde estava. Bom resumo da Ópera: Tomamos 352 cervejas, conhecemos um grupo de nativas bem abertas ao relacionamento, no sentido bíblico da palavra, e só lembramos do carro as 3 da matina. O engraçado dessa história, além dos tapas, foi o DESESPERO que voltamos correndo pro carro, somente para constatar que o pobre Tibério dormia ainda, NA MESMÍSSIMA POSIÇÃO, com o carro todo embaçado. Dessa vez meus tapas surtiram efeito, o cara acordou e fomos dormir...Einstein hoje é ortopedista dos bons, assim como Tibério. Marco Antônio foi meu veterano na anestesia e ainda trabalha e mora no RJ.

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Praia em Guriri...
  Em outra situação de Carnaval em Guriri(gostávamos muito de lá, fica no Espírito Santo), após a noitada voltamos pro hotel exaustos. César e Augusto eram dois irmãos enormes, muito fortes mas absolutamente pacíficos, odiavam briga. César inclusive foi campeão juvenil brasileiro de judô e foi cotado pra ir para Olimpíada de 1988, naquela época era também faixa preta de jiu jitsu, é anestesista hoje e foi meu companheiro de plantão durante um bom tempo. Augusto não era tão grande, mas era tão alto quanto César, 1,98 mais ou menos, então dá pra imaginar os dois numa altercação mútua...não sobraria nada em pé, talvez nem as paredes.
Código de Barro
  Voltamos então para o hotel e César, meio bêbado, disse que estava se sentindo mal, provável gastroenterite aguda causada pelo álcool mais os dois xis-tudo que ele havia consumido em apenas quatro dentadas. Foi ao banheiro e evacuou copiosa e sofridamente, deu pra escutar os gemidos e imaginar o suor frio e as jugulares dilatadas. Depois tomou banho e foi deitar. Na manhã seguinte fui acordado pela discussão fortíssima dos dois, achei que era o Armagedon. Chamei mais 2 colegas e conseguimos separar os brigões. Indaguei então os motivos. Augusto contou que César, bêbado na noite anterior, não achando papel higiênico no quarto, havia se limpado com a toalha de rosto, pendurado de volta com a freada virada pra dentro ( o tradicional "código de barro"), e Augusto só percebeu a artimanha quando foi enxugar o rosto. Imaginem o resto da cena...
   Bom gente, vou ver se encontro algum assunto sério pra falar no próximo post, pra variar um pouco.



  
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
    Bom, nem só de trabalho e estudo vive o homem, então deixei pra esse segundo post algumas historinhas que vi ocorrer na minha faculdade e residência durante férias e carnavais. Nunca dei vexame por causa de bebida, o máximo que eu fazia era dar carinho e amor praquela pobrezinha em final de noite que ninguém queria. Sempre fui resistente pro álcool e sei a hora de parar. Os envolvidos aqui terão seus nomes resguardados por motivos óbvios, atualmente são médicos e chefes de família respeitáveis do Rio de Janeiro.
    Numa Oktoberfest qualquer chegamos da noitada e um grande amigo que chamarei aqui de Einstein tinha desaparecido. Fomos dormir e no dia seguinte ao meio dia nada do cara. Comecei a ficar preocupado e ligar para hospitais e delegacias e nada. Daí umas 2 horas Einstein aparece com um cheiro horrível e desaba na cama. Dormiu até as 9 da noite, acordou como se nada houvesse e foi tomar banho para sairmos de novo. Perguntei o que tinha acontecido e Einstein não se lembrava de nada, tinha tomado Buscopan e misturado com álcool na véspera (o verdadeiro Boa Noite, Cinderela) e não lembrava do que tinha feito.
    Bom, saímos então pra noitada e logo ao chegar no Pavilhão de Blumenau, entramos numa lojinha de lembranças. De repente um grupo aponta para o Einstein e grita: "Ih, alá o maluco do ônibus..." Todos chegam perto da gente pra saber como ele estava e tal, era um grupo de Curitiba(aliás, parabéns às curitibanas pela beleza...). Lógico que fiquei curioso e perguntei o que tinha acontecido, resumo das Ópera: Einstein, desnorteado pela mistura maléfica, tinha ido para um ônibus do pessoal de Curitiba, daqueles que ficam parados em Blumenau e seus passageiros dormiam no próprio ônibus, tentou agarrar em vão umas 2 ou 3 meninas e depois de fracassar, simplesmente vomitou em dois bancos e dormiu em cima, acordou no dia seguinte com odor de um urubu, saiu e pegou um ônibus de volta para o hotel. Testemunhas juram que ele ainda agarrou uma, digamos, nativa da região antes de ir embora...COM AQUELE CHEIRO!!  Esse cara era foda...E o que é pior, em um Carnaval anos depois ele repetiu o feito, misturou sem querer a bebida e o remédio, se perdeu, passou andando pelo hotel e foi desmaiar num milharal a 2 KM, e voltou de carona com a bicicleta do entregador de pão, fedendo e cheio de mato e formigas pelo corpo. Saudade de você cara, quando for ao Rio vou te visitar...
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Se for transar, não beba
    Outro grande amigo, Openheimer(hoje grande ortopedista do Rio...), estava há meses tentando, digamos, levar ao leito uma linda donzela, sem sucesso. De tanto insistir, conseguiu, marcou tudo, ansiedade em alta. Antes ele passou numa festa de aniversário na Lagoa, começamos a tomar Red Label. Lá pelas tantas, já torto, foi embora com a dama e dias depois encontrei com ele e perguntei se tudo tinha ido bem. Ele me contou o que se segue: Openheimer levou a madame a um motel e chegando lá, pelo efeito do álcool, não conseguiu desenvolver toda sua potência (palavras dele:"Tava meio duro meio mole feito massa de risole..."). Decepcionado, ele levou a senhora para Hidro, esperando que isso o animasse.  Ele então vomitou dentro da hidro, com a mulher e tudo. Após momentos de constrangimento e muito papo, tomaram banho e voltaram pra cama. A menina então começou a fazer um striptease pra ele e essa foi a última coisa que ele se lembra, acordou no dia seguinte às 2 da tarde, a dona tinha ido embora, claro. Desnecessário dizer que ela nunca mais atendeu suas ligações...
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Cuidado com o pombo...
    Em um Congresso de estudantes de Medicina em Salvador, estava Openheimer com uma nativa, num lugar aberto e verde do Campus aonde estávamos empilhados em barracas. Estava perto de uma árvore quando passa outro colega, Freud, totalmente bêbado. Como Openheimer já sabia do que ele era capaz, se afastou um pouco com a moça e viu Freud subir na árvore. Preocupado, ficou olhando pra ver se ele ia cair. E não é que Freud, hoje excelente urologista, se despe no alto da árvore e digamos, evacua lá de cima igual a um pombo!! Openheimer começa a gargalhar e a moça foge correndo, nunca mais foi vista...
  Aliás Freud tinha a mania inexplicável de se despir quando bebia demais, ele conhece delegacias pelo Brasil inteiro...


Se beber demais procure um hospital...
  
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Código de Hamurábi
Será que era melhor beber cerveja que água?
    Dizem que provavelmente foi a cerveja que possibilitou o aparecimento das primeiras cidades, sua primeira referência é suméria, 2600 a 2350 a.C. Seu advento possibilitou "armazenamento" de cereais, sob forma de "pão líquido". A cerveja tornou-se vital para todas as civilizações produtoras de cereais da antiguidade clássica, especialmente no Egito e Mesopotâmia. O Código Babilônico de Hamurábi dispunha que os taverneiros que diluíssem ou sobretaxassem a cerveja deveriam ser supliciados, tamanha sua importância. Há teorias sobre o aparecimento de um gene para o alcoolismo, provavelmente na maioria dos lugares as fontes de água não eram confiáveis, e só quem tinha maior resistência ao álcool teria maior chance de sobreviver, pois era melhor morrer de cirrose aos 40 anos que de cólera ainda criança. Teoria da evolução de Darwin em ação, como sempre.
Fígado cirrótico. Bonito, não?
  O alcoolismo é um problema de saúde pública, em que são gastos milhões de reais por mês em tratamentos de patologias causadas direta ou indiretamente por seu consumo, desde cirrose hepática até traumas automobilísticos ou morte por motivo violento. O consumo moderado de algumas bebidas, como vinho, no entanto, já provaram trazer benefícios à saúde. Na vida do médico o álcool é uma fonte inesgotável de histórias, além dos "causos" .
Pimba conversando com Drummond de Andrade
Qual médico, em passagem naquele estágio de PS, não tem uma porrada de histórias engraçadas sobre os cachaças? Ou, como se diz no Rio, os "pimbas". Pimba é sigla para Pobre indigente mendigo bêbado alcoolizado, ou também "mulambos" ou "jacarés" como se fala em São Paulo. Dei plantão como acadêmico bolsista no Hospital do Andaraí, no Rio de Janeiro e tinha um plantonista que adorava atender os pingas. Ele dava o atendimento correto clinicamente falando, mas nunca deixava de sacanear alguns deles. Ele inventava "exames" como ausculta de ondas cerebrais, radiografia da "aura", entre outros. No livro do Dário Birolini que eu já comentei aqui, A estratégia da Lagartixa, ele conta um "causo" em que chegou um cachaça enchendo o saco no PS pois queria que medissem sua pressão intra craniana. Essa medida é feita através da colocação de um cateter nos ventrículos cerebrais e tem indicações específicas, o que não era o caso. O cara insistiu tanto que o atendente pegou um aparelho normal, de pressão arterial, e passou em volta da cabeça do cara igual a um turbante, encheu o manguito e disse categoricamente:120x80, pressão normal, pode ir...
A mulher às vezes não ajuda...
   Essa aconteceu comigo, já trabalhando após a especialização. Chegou um paciente, completamente embriagado de madrugada pra fazer fixação de fratura exposta na perna, de estômago cheio. Virei o cara e fiz uma raque e embora já tivessem feito medicamentos para náuseas antes da cirurgia, ele vomitou copiosamente após a anestesia. Depois de melhorar um pouco e iniciar a cirurgia, ficava dizendo que quando voltasse pra casa ia "enfiar a porrada" na mulher. Fiquei curioso e perguntei porque, já rindo da insistência do sujeito. O cara vira e me solta essa: "Se aquela fela da puta soubesse cozinhar eu não tinha passado tão mal, e se ela enchesse menos o meu saco eu não beberia tanto..." Após as gargalhadas de praxe, pus o cara pra dormir...
segunda-feira, 11 de outubro de 2010


Criação de Adão...
    Por favor, o conteúdo deste post é só e somente minha opinião, além de como me tornei ateu. Respeito toda e qualquer pessoa com pensamento diferente do meu, desde que não venha a interferir com minha vida negativamente. E, como eu costumo dizer, minha opinião não vai mudar o mundo...
    Num mundo em que  a educação, a internet, a globalização deveriam ajudar a exterminar a falácia da religião da vida do homem, o que se vê, infelizmente, é o oposto; cada vez mais se vê gente de todas as raças e níveis sociais dedicando tempo precioso de suas vidas em “adorar” ou “louvar”  a “deus”. A admissão do ateísmo gera  repulsa, às vezes até agressiva, no mínimo um desconforto. Eu diria até que o ateu hoje ocupa a posição que era do homossexual em outras épocas. Um candidato à presidência pode admitir ser ateu? Melhor não...
   Me lembro bem quando fui fazer a ficha de admissão de minha mulher quando do nascimento de nossa primeira filha, numa maternidade administrada por uma ordem religiosa em minha cidade, a freira fazia o cadastro, perguntou “Religião”, ato contínuo respondi “agnóstico”...ela levantou os olhos da ficha, como que não acreditando, depois fez uma negativa com a cabeça. E agora, pensei, teria eu feito bobagem? Minha mulher não seria bem atendida por causa desse detalhe?  Será que não era melhor eu ter engolido em seco e mentido?
Fadas são legais pra tatuagem...
   Em primeiro lugar o termo “ateu” em si é um paradoxo. O “a” é um prefixo de negação, mas se não cremos na existência de deus ou qualquer tipo de divindade, a palavra não existe. Explico: não creio na existência de fadas, isso faz de mim um “afada”?  O agnosticismo talvez seja uma denominação melhor, isto é, é impossível comprovar a não existência de qualquer entidade sobrenatural. Ora, o ônus da prova é de quem afirma... Mas vou usar o termo "ateu" que já está sedimentado pelo uso.
   Fui criado por uma família católica, fiz catecismo, crisma e etc, mas nunca foi suficiente pra mim as explicações que a Igreja dava para os mais diversos assuntos, além do fato de eu achar hipócrita fazermos coisas que a Instituição condenava e se dizer daquela religião. O processo aconteceu lentamente, o rompimento foi gradual e surpresa, eu continuava honesto e ético mesmo depois de não mais acreditar em nada daquilo...o mais difícil hoje talvez seja convencer minha mãe que uma criança pode ser educada e se tornar uma pessoa boa sem “deus”.
Rosa Parks presa...
   Porque a sociedade acha que toda ética vem de “deus”? Isso foi implantado em nossa cabeça igual a um microchip, mas pare pra refletir. Você imaginaria hoje alguém entrando no ônibus e mandando uma senhora negra se levantar? Isso nos anos 40 ou 50 era absolutamente normal e mudou...o que teve "deus" a ver com isso?  Na minha cabeça foi uma conscientização coletiva do que é certo e errado neste caso, algo que Rosa Parks nos fez enxergar de maneira brutal...

Esse exemplo apenas ilustra um caso em que a SOCIEDADE progrediu, como em vários outros. A Igreja não sustentava a escravidão, baseada em algo escrito na Bíblia? Mas a bíblia mudou? Não, o que mudou, segundo os teólogos, foi a "interpretação", algo que meu pai chama de "hermenêutica" ou "exegese"... Se você pegar um determinado livro da Bílblia, não pode ler de maneira literal, ou seja, não vamos apedrejar uma mulher por adultério, certo? certo, mas logo abaixo, por exemplo, vemos a demonização do homossexualismo. Daí, sim, podemos seguir literalmente o que está escrito.

Daniel Dennet, um dos expoentes do ateísmo e darwinismo "pitbull"
 Não tenho certeza se concordo que as massas devam ser mantidas sob o tacão da religião, que afinal de contas tem seus benefícios, mas baseados em algo que não creio. Sobre o "acreditar no acreditar" o conciso Daniel Dennet tem mais a oferecer em sua obra filosófica do que este aprendiz de blogueiro.

Não esgotei o assunto religião, volto ao mesmo em outro dia...
sábado, 2 de outubro de 2010
Eu de mau humor...
Há situações em todas as especialidades médicas em que o paciente ou o acompanhante do mesmo te levam ao erro ou acidente por pura falta de bom senso, ou simplesmente te tiram do sério. Todos passamos por isso com certa frequência, mas as vezes a paciência nos deixa na mão...

Laranja assassina...
Certa vez, ao induzir uma criança pra uma cirurgia banal, notei que a máscara, que era transparente(ainda bem...) estava amarelada por dentro. Tirei a máscara da face e havia vômito amarelado por todo lado, e a criança broncoaspirou, ou seja, foi conteúdo gástrico, amarelado, para os pulmões. É pra evitar isso que pedimos o famoso jejum pré operatório. Tomei as condutas de praxe, intubei rápido depois de aspirar a secreção e radiografei depois e vi que realmente tinha broncoaspirado e faria uma pneumonia. Fui falar com a mãe depois pra explicar o que tinha acontecido e dizer que precisaríamos tratar com antibióticos. Perguntei sobre o tempo de jejum, daí ela confessou que tinha dado UM COPO DE SUCO DE LARANJA porque tinha ficado com pena do filho... respirei fundo pra não agredi-la e paguei um esporro na mulher, só então acho que ela entendeu a gravidade do que tinha feito. Por sorte a a criança ficou bem, sem sequelas...
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Entrei pra fazer uma anestesia num hospital chique do Rio, a paciente era, diria, um pouco espalhafatosa na maneira de se vestir e falar. No quarto, quando ela me viu, fez um barraco, dizendo que queria um anestesista com experiência, e não aquele "moleque" com cara de "estudante". Não adiantou dizer há quanto tempo eu fazia aquilo nem quanta experiência tinha, só com a intervenção do cirurgião ela "aceitou" ser anestesiada por mim. Correu tudo bem, e após a cirurgia ela ficou super agradecida, falando mundos e fundos do quanto tinha gostado, que me chamaria dali por diante pra fazer anestesia nela e na família toda dela. Pagou e fui embora. Quando fui depositar seu cheque, vi que tinha sido sustado. Liguei para a madame e ela foi vaga, deu desculpas e me enrolou com aquele cheque um bom tempo, até que não atendeu mais ligações. Tive que colocar o cheque dela no protesto e receber na Justiça.
Amo peruas...
No dia da audiência ela foi ao tribunal e , sem sequer me olhar na cara, quis dar outro cheque. Falei que queria dinheiro vivo, que não aceitaria mais cheques dela. Ela disse que não o possuia em espécie, e o oficial de justiça, rindo, sugeriu que ela fosse ao banco sacar. A madame foi, trouxe e quis me entregar em mãos. Pedi ao oficial que a dissesse pra colocar a grana em cima da mesa, pois eu não pegaria de suas mãos. O cara quase explodiu de rir e repetiu o pedido. A moça ficou furiosa, jogou o dinheiro,saiu bufando...
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Traíra, peixe comum em nossos rios...
Uma colega uma vez mandou me chamar em sua sala, pois nem ela nem o residente dela tinham conseguido intubar um paciente. Quando entrei na sala, o caos instalado, sangue e secreção em quantidade na boca do paciente, vi que realmente a intubação era difícil, e o cara tava roxo. Coloquei rápido uma máscara laríngea, que é um outro dispositivo de ventilação, tirei da crise e vi que tinha um dente solto, comum em tentativas sucessivas de intubação. Retirei o dente com as mãos e depois, com calma, consegui intubar com dificuldade. Muitos "obrigados" depois por parte da colega, voltei pra minha vida. Um tempo depois essa colega me aborda pra ajudá-la a pagar o tratamento dentário do paciente, que se não houvesse acordo o paciente iria processar-nos e meu nome estava na ficha dela, COMO AUTOR DA AVULSÃO DENTÁRIA... Argumentei com ela, que eu tinha entrado pra ajudá-la, que o dente estava quase caindo já, mas não adiantou. Somente após o Chefe do Serviço dar uma catracada na colega é que ela desistiu de me cobrar. É mole?







  

Quem sou eu

Médico, anestesista, ateu e peão

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